quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Patrulhismo na imprensa regional

Foto: Observatório da Imprensa


          Lá no início de 2012, o Vigilantes da Notícia foi o primeiro projeto da faculdade que me inseri. Eu já conhecia o projeto antes disso. Enquanto procurava por recomendações sobre os cursos de jornalismo de Ribeirão Preto, o blog, idealizado pelo Igor Savenhago, me apresentou as primeiras credenciais do que eu encontraria no meu futuro.

          Lembro que, na época, em nenhum dos textos publicados pela página havia qualquer menção pelo Centro Universitário Barão de Mauá, no qual eu iria me matricular, e onde o curador do blog trabalhava. 

          Passados quase quatro anos, hoje me sinto um profissional já, embora naquela época o Igão já dizia que éramos jornalistas. Agora, inserido em um projeto arrojado do Portal Revide, em que venho trabalhando há dois anos, noto que a mídia regional nunca teve um projeto de tamanha ambição. Contamos com um jornalista experimentadíssimo, o Guto Silveira, uma editora competente e com muito a ensinar, a Marina Aranha, um repórter século XXI, o Bruno Silva, e estagiários, no qual me incluo, com muita vontade de aprender.

          Essa ideia de trazer para Ribeirão Preto - e por que não região? – um portal de notícias que dialogue com as características com a terra do chope tem apresentado muito descobertas, justamente por ser algo inovador, embora exista o G1, porém muito mais atrelado aos outros veículos da Rede Globo/EPTV, do que o nosso portal é com a edição impressa.

          Cada dia um fato, no sentido profissional, e não a pauta propriamente em si, tem se apresentado para nós, que estamos botando esse site para rodar, e também para os leitores, e até para a imprensa regional. Na semana entre os dias 16 e 21 de novembro, aconteceram três exemplos, que curiosamente me afetaram. Vamos lá.

         A primeira situação é o contato com a assessoria de imprensa de uma equipe esportiva de Ribeirão Preto. Na quarta-feira, 18, recebemos a ligação de uma representante de nosso setor comercial contando que o filho de um dos clientes da revista, que é jogador de handebol, estava se organizando, com outros atletas de diversas modalidades, para cobrar na prefeitura de Ribeirão Preto uma dívida a respeito do Bolsa Atleta.

          Fomos atrás dos organizadores, para abordar com eles os motivos. Um dos esportistas pediu que o nome dele permanecesse anônimo. Ok, é um direito dele, e respeitamos. Fizemos a reportagem e subimos para o portal. Passaram algumas horas, e vem o aviso: “o assessor de imprensa de XXX pediu para você ligar para ele, e não citar nome de XXX no texto” – isso mesmo, após o texto no ar, SEM o nome do atleta. O assessor nem sequer leu a matéria e já quis opinar sobre o conteúdo que já estava no ar.

          A segunda situação aconteceu no dia seguinte. Passávamos a tarde, quando a Folha de S. Paulo publica em seu site que o governo do estado suspendeu a reorganização escolar. Checando a informação, descobrimos que na realidade foi uma proposta do governo, dizendo que pretende rediscutir a reorganização em troca do fim das ocupações de escolas por todo o estado, e enquanto essas discussões acontecem, a reorganização estaria suspensa temporariamente.

          Meus caros, confesso que o jornalismo não é 100% santo. Para chamar a atenção na manchete, eu optei por destacar que a reorganização estaria suspensa TEMPORARIAMENTE, como de fato foi proposto. Mesmo assim, na reportagem, expliquei a situação, e para firmar mais credibilidade na notícia coloquei as propostas apresentadas pelo governo ao Ministério Público e que foram distribuídas para a imprensa de todo o Estado. Novamente, horas depois, vem a ligação da assessoria de imprensa da Secretaria Estadual de Educação, firmando que a reorganização não está suspensa, como se dissesse que eu cravei essa notícia, mesmo eu explicando a situação, ou seja, os assessores do Estado só leram a manchete e não acessaram o conteúdo.

          A terceira situação ocorreu neste sábado, 21. Fui a padaria, e me deparo com um exemplar do semanário O Momento Atual, de Sertãozinho. E leio na capa a seguinte chamada: “Dedini não confirma o fechamento de fábrica na cidade”, e me espanto com a linha fina: “Empresa não confirma notícia divulgada em revista regional que diz que a empresa fechará a unidade de Sertãozinho”.

          Voltemos agora a terça-feira, 17. Todos os dias, procuro chegar na redação pelo menos trinta minutos antes de início ao meu expediente. Neste período, procuro dar uma lida nos principais jornais do país para ver se há alguma notícia a respeito de Ribeirão Preto ou de municípios vizinhos. Normalmente, não encontro muita coisa, mas neste dia específico, sim. 

          A informação exclusiva para assinantes do jornal de economia Valor Econômico era sobre a Dedini, empresa do setor metalúrgico, que tem uma unidade em Sertãozinho. E lá estava o que procurava, dizia que a empresa, que se encontra em processo de recuperação judicial, entregou uma proposta à justiça, que prevê o fechamento da fábrica em Sertãozinho, para o pagamento de dívidas. Uma boa pauta.

          Então, publiquei a seguinte manchete: “Dedini planeja o fechamento da unidade de Sertãozinho”. Não cravei que fechará e, ainda por cima, disse no texto que é uma proposta entregue, e que deve ser avaliada pela justiça e pelos credores, no qual encontram-se funcionários da empresa, que simplesmente podem recusar. Novamente, nos deparamos com uma má interpretação do texto, que, agora, ao invés dos assessores de imprensa, só estão fazendo o trabalho deles, que é blindar a imagem de seus clientes, é de um outro veículo, que ao invés de se atentar as palavras “planeja” e “proposta”, deu a entender que só leu “fechará”, que em nenhum momento afirmei que isso iria acontecer.

          Dessas situações, tiro algumas lições, e até certo ponto positivas, embora algumas me chateiem muito. Os lados legais é que estamos sendo monitorados e estão tomando o Portal Revide como fonte de informação. O nosso principal objetivo, que só pode ser alcançado em um trabalho de formiguinha realizado diariamente por meus colegas e por mim, além da liberdade dada pelos donos da Revide.

          Mas o que me deixa encabulado é o excesso de “fiscalização” e tentativas de se impor aos órgãos de imprensa por parte dos assessores, que deveriam entender que cada profissional tem que fazer seu trabalho com respeito, pois somos peças que necessitam da outra, e esse patrulhismo não é sadio, pois pode trazer desavenças. As situações nas quais estive inserido foram mais pode descuido dos assessores, que preferiram parar de ler na manchete, do que ler e compreender a situação que está sendo passada.

          Já no caso do O Momento Atual, fico contente por saber que um outro veículo está se pautando a partir do que descobrimos lá na Revide, e essa é mesmo a nossa intenção. Mas fico chateado pelo tom com que o assunto foi tratado pelo semanário, isso porque o assunto principal para o repórter que publicou essa réplica não foram as consequências que um possível fechamento de uma empresa na cidade pode trazer, mas sim rebater a informação publicada por outro veículo. O que no fim das contas não se mostrou muito efetivo, já que eles também não obtiveram uma resposta concreta de “sim” ou “não”, mas um “não confirma”.

          Sinto que isso ocorre devido à novidade que os portais de notícia ainda apresentam para essas pessoas. No universo online, muita coisa ainda é obscura, mas deve-se dar crédito a trabalhos bem feitos quem vem sendo realizados para criar alternativas para sobreviver nesta nova realidade. Talvez, se essa informação de um planejamento sobre o futuro de uma empresa fosse publicado por um jornal – como ocorreu, a notícia em primeira mão foi do Valor –, a resposta do jornal não iria ter ocorrido com tanta “virulência”. Talvez o Momento pudesse até se pautar por aí, mas buscando entender as consequências, e não rebater uma informação de um jornal que nem sequer é concorrente, já que a mídia é diferente, e por ventura é até parceiro da Revide.

Leonardo Roark dos Santos
Jornalista
Ribeirão Preto/SP

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